O SISU, Sistema de Seleção Unificado, já está com o site aberto. Podemos verificar quais as universidades públicas que irão participar do processo, os cursos e as respectivas vagas. As inscrições iniciam dia 16 do próximo mês. Mais ansiedade. Mais desejo. Mais sonhos. Será que a máquina logística que organiza este processo de seleção tem a menor idéia de tudo que envolve emocionalmente falando em nossa vida durante o mês em que ele acontece?
O nervosismo de entrar a cada dia na página da internet, rezando para que a nota de corte tenha baixado e se consiga o curso tão desejado, na universidade tão sonhada. Desejo que não é de ontem. Luta que é de exatamente cinco anos. Cinco anos que foram vividos não sonhando sentada no sofá. Sonhando daquele jeito que os guerreiros sonham: lutando. Peleando. Cada dia uma nova batalha. Fome. Cansaço físico. Esgotamento nervoso. Culpa. Dores no corpo aguentadas no osso, porque não havia dinheiro pra remédio. Nem pra dor de cabeça. Sair de casa com o estômago vazio e andar sete, oito quilômetros. Sim, também não havia dinheiro para o ônibus. Voltar da faculdade de noite, sem saber o que mais afligia: o cansaço físico, o medo de ser assaltada, a escuridão e o deserto das ruas, os conflitos emocionais, a culpa de não largar este sonho que castiga tanto. Cada estágio conseguido uma vitória comemorada como se fosse o meu Hexa de Copa do Mundo. A bolsa era mínima, mas para mim era uma fortuna. O fato de estar atuando na profissão que tanto amo, que tanto desejo, me mantinha de pé. Talvez isso tenha me alimentado durante tanto tempo. Talvez tenha sido isso que me manteve com energia pra continuar brigando pelo que quero. Eu me dediquei de corpo e também de alma. Eu dei tudo que tinha. E tinha bem pouco de material. Então tive que tirar de minha essência pra dar.
Haviam caminhos menos dolorosos. Mais fáceis. E as pessoas nem notam que estamos seguindo um caminho errado. Elas também vivem caminhando pelas estradas mais bonitas, mais fáceis e justificando suas escolhas com argumentos patéticos: eu preciso, eu não sei, eu não consigo, eu sofro demais.
Existe em cada decisão duas alternativas para escolher: o que é melhor pra gente e o que é o certo a fazer. O que é melhor pra gente normalmente é mais rápido, indolor. Enquanto que o que é certo a fazer não passa por cima de ninguém e não fere os princípios de honestidade, dignidade e ética. O que se prefere: estar certo ou ser feliz? Eu preferi estar certa. Percorri um caminho árduo, ainda sigo nesta estrada e não sei se não aparecerão outros trechos de pedra. Mas hoje sou feliz.
Certamente nenhum dos burocratas sabem que neste concurso, o sistema computadorizado que põe as notas em ordem, estará selecionando corações. Que estão colocando a mão no que temos de mais íntimo e secreto: nossa expectativa de futuro! O que queremos ser quando crescer, desde que éramos crianças. Tantos processos que já participei, tantos nãos que recebi. Não sei por que não desisti ainda. Não tenho a menor idéia. Qualquer pessoa de "juízo", já teria desistido há muito tempo. Não conheço NINGUÉM que tenha passado por metade das coisas que passei. Sem disputa pra ver quem é mais vítima. Não preciso disso. Escolho meus caminhos e pago o preço por eles. Simples assim. Mas ao andar, percebo o que acontece à minha volta. E nunca, em nenhuma estrada ou ruela, me deparei com alguém que tivesse um pedaço da minha persistência. O que fez também com que eu tivesse que manter em segredo o que realmente estava acontecendo comigo, caso contrário as pessoas acabariam me convencendo, ou me obrigando a abandonar tanto martírio e arrumar um "emprego decente" para sustentar minha filha. Não precisava de ninguém pra me desestimular. As coisas já estavam bem difíceis. Então, botava um sorriso no rosto e fazia cara de paisagem. Rebolei bastante pra dar conta disso, pra disfarçar a minha situação, eu que detesto mentiras, tive de usar muita criatividade pra falar a verdade e concomitantemente omitir a realidade. Afinal de contas, eu sabia que ia sobreviver, sempre sobrevivo e eu queria pagar pra ver. Venci aquelas batalhas, mas a guerra continua.
O SISU abriu de novo!!!!!!
E se existe algo que tenho certeza absoluta, é de que não irei desistir. Não irei. Mesmo fazendo Terapia Ocupacional, e esta ser uma profissão que abrange a área em que quero trabalhar que é o Acompanhamento Terapêutico. Eu ainda quero ser Psicóloga. Hoje estou menos desesperada. Não só pela situação financeira que não é mais de extrema pobreza, mas também pelo fato de que no máximo em três anos e meio terei uma profissão. A Psicologia não tem mais o peso de ser aquilo que vai me fazer ter uma vida profissional decente e estar a salvo, enquanto mão de obra não-especializada e não-definida, da exploração dos empresários. A Psicologia agora não tem mais uma de suas faces destrutivas, retalhadoras, que me faziam mostrar a todo tempo e com toda força o quanto eu a desejava. Já mostrei o quanto eu mereço. Agora só preciso esperar o tempo necessário para conseguir.

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