sábado, 27 de fevereiro de 2010

Cuba

Em Dilemas Cotidianos me inspirei para escrever esta postagem.
http://dilemascotidianos.blogspot.com/2010/02/as-imorais-licoes-de-moral-de-william.html
O blog traz textos sempre atualizados e expressos de forma autêntica. Expõe seus posicionamentos e atitudes naturalmente. Uma das principais críticas do autor, a qual me associo, é o quanto as pessoas colocam os interesses pessoais e financeiros invariavelmente acima dos valores pessoais e humanos. E o pior: o quanto a sociedade credibiliza isso. As coisas escandalizam, ah! mas se foi por dinheiro tudo bem então. Lembro de quando o jogador Adriano rompeu o contrato com um time europeu e voltou para o Brasil. Não gosto de futebol, e não acompanho nada em relação a isso. Mas lembro de minhas colegas de Psicologia, comentarem isso em aula. Uma delas, jornalista de um grande veículo aqui do Vale dos Sinos, declarou que ele era dependente químico. Pra minha desgraça a professora manteve o debate, interrompendo a aula e eu fiquei ali sendo atualizada do mundo do futebol através da ótica de gente que não respira oxigênio e sim contas bancárias. "Claro que isso só pode ser problemas com drogas. Imagina, o cara vai deixar de ganhar milhões, que absurdo! Que esperasse mais um ano, ganhasse a grana e depois voltasse" - bradavam.

Até hoje não sei se o tal Adriano é dependente ou não. Na época ele alegou estar com saudade da família. Mas pra mim não faz diferença. O que me espantou e me agrediu até, é o fato de que não se pode nem levar em consideração o fato de uma pessoa achar mais importante estar ao lado da família, dos amigos e do lugar onde cresceu, mesmo sendo uma favela como é o caso dele. Isso não existe, se o cara quis vir embora é porque tem problemas e sérios. Eu tentei argumentar que ele não ia voltar pra "pobreza" como elas estavam dando a entender, com certeza se ele era o grande jogador que elas diziam (porque eu nem sabia quem era) ele ia continuar jogando bola aqui, se não fosse milionário, fome não passaria. E já ganhou bastante dinheiro, deveria ter uma reserva, investimentos, etc. Mas elas não entendem. Não ter um carro importado, sapatos e roupas de grife, vários empregados, vários imóveis, viagens caríssimas, é passar fome.

E é essa legitimação que faz com que o Jornal da Globo e todos os outros canais de mídia continuem também divulgando somente o que lhes convém. Divulgando não, estou sendo tênue, deturpando. Na teoria o discurso é tão lindo que me comove, somos irmãos,somos todos iguais, abaixo o racismo, ah, tem aquela "o dinheiro não traz felicidade", blá blá blá. Na prática, as pessoas dissimulam, atropelam, destroem em nome de dinheiro. As pessoas são podres, mas continuam com a pose de boazinhas. Nossa, isso me tira do sério. Isso é enlouquecedor. Não é por acaso que o Renato disse que a solidão é o mal do século. Cada vez mais os contatos humanos se restringem e os shoppings se enchem. Comprar, comprar e comprar. Mais e melhor.

E esta mesma turminha que tive de aguentar nesta aula, também fez, num outro momento de aula interrompida para as minhas sapientíssimas colegas exercerem seu direito de opinião, uma exposição contra Cuba. Ah, mas lá o povo passa fome, não pode comprar uma roupa, são uns coitados. Vale a pena hierarquizar as minhas colegas: uma é jornalista de um grande jornal do Vale dos Sinos como já mencionei, outra é filha de um vereador de Novo Hamburgo, outra é atual esposa de um grande empresário (atual, na época da primeira esposa ela era secretária ainda...), outra é esposa de um grande neuro-cirurgião, e segue neste nível. Elas não só não sabem sobre Cuba e sua história, como também não sabem do Brasil. Dentro de suas caminhonetas climatizadas elas não atinam que aquilo se movendo no sinal não é um bicho. É uma criança. Está pedindo dinheiro pra comer e pra não apanhar quando voltar pra casa. Aquilo outro, é uma fila. Enorme. Não é pra comprar ingressos para um show, bonitinhas. Ali é um posto de saúde. Estas pessoas de pé estão doentes, precisam de atendimento, mas se saírem da fila perdem a vaga. Ah, mas elas estão indo embora....pois é, o médico não vai vir atender hoje. Ali vai uma moça. é balconista. Queria ser fonoaudióloga, mas não têm grana pra pagar a faculdade, e nem consegue vaga numa universidade federal. Não porque não se esforça. Mas porque só existem 40 vagas por ano. Pode se quebrar estudando, que só os 40 melhores do Rio Grande do Sul e também de outros estados (porque estudantes de outros estados vêm fazer vestibular aqui, se passarem o papai paga o apto para o filhinho se mudar pra cá) é que irão conseguir uma vaga.

Em Cuba, o ensino é de graça. Alguém consegue imaginar o que é isso? Querer estudar e poder? A saúde é a melhor do mundo. E não há só tecnologia, há também acessibilidade. As pessoas procuram atendimento e conseguem. Lá se come, todos comem, todos os dias. Não há trapos, as pessoas possuem roupas. Todas as pessoas possuem.
Vocês não vêem isso, né coleguinhas? Ah, me desculpa. Vocês também comem todos os dias, né? Ah, é verdade. E comem muito bem, né? Salmão, caviar, vinhos importados, que mais? Sim, vocês também tem médico, o papai paga o plano de saúde caríssimo, né? E as roupas...imagina, que gafe a minha. Vocês também se vestem com roupas e não com trapos. Ah, é. Aliás nem repetem, né? As roupas de grife são usadas só uma vez, é, tinha me esquecido. Bah, que vergonha que sinto agora. Me desculpem. Nossa, imagina que vocês iam achar Cuba um país bom, né?
Ainda mais agora que a Globo disse que eles estão "violando os direitos humanos", nossa se a Globo disse é verdade. Tem um até que já morreu de fome. Que horror!!!

Ninguém divulga que no Brasil, 50,6 % das famílias percebe menos do que 1 salário mínimo federal por pessoa. Dados do IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2007. Mais da metade da população está na linha de pobreza.

Aprendam a pensar, caras colegas. A ignorância de vocês legitima e mantém a situação do país nesta vergonha. Depois a gente conversa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário